Cláudio De Cicco*
Tenho lido na imprensa que repercutiu mal no Vaticano a decisão do Presidente norte-americano Barack Obama de rever a política anti-aborto dos governos anteriores, tirando qualquer impedimento legal para o uso de recursos federais norte-americanos para a promoção do aborto no mundo.
É de conhecimento geral que a eleição de Barack Obama para presidente dos Estados Unidos da América foi saudada dentro e fora daquele país como o início de uma "Nova Era" de compreensão e paz para o mundo. Confesso ter compartilhado de uma certa emoção por ver um afrodescendente chegar à suprema magistratura de um país conhecido no passado como racista. Também achei simpático da parte dele convidar para Secretária de Estado sua contendora Hillary Clinton.
Mas no seu discurso de posse ele proclamou: "A sociedade muda, os Estados Unidos tem que mudar com ela." Só agora entendi o sentido da frase barackiana: quando a sociedade muda, é preciso mudar sempre. Será? E se mudar para pior? Obama representaria a mudança sem estar preso a nenhum valor, pois um dos seus atos inaugurais de governo foi revogar o impedimento legal para o financiamento de campanhas abortistas fora dos Estados Unidos, o que vinha sendo reiteradamente reafirmado pelos governos republicanos. Ora, é no mínimo falta de coerência fechar Guantanamo, por motivo humanitários e depois liberar verbas para o financiamento de massacres de inocentes. Afinal, nisto os dois Bush, Ronald Reagan e demais republicanos estavam certos.
Muitos dirão que isto já era esperado, pois Barack Obama nunca escondeu ser abortista. Mas cabe então ponderar se isto foi enfatizado suficientemente por ele em sua hábil campanha, em que os holofotes estavam mais centrados sobre a crise econômica e sobre a situação no Iraque. Seria o caso de supor que os eleitores esqueceram esta questão? Aliás, o que não faltou nesta campanha foi emocionalismo, envolvendo o "Dream" de Martin Luther King, o sorriso aberto de Obama e um apoio total da mídia americana e mundial pró-Barack.
Por acaso, gravei um dos debates entre John McCain e Obama, em que o simpático senador por Illinois não respondia a nenhuma das contundentes perguntas de seu rival. Saía pela tangente e mudava de assunto. No entanto, no dia seguinte a imprensa inteira noticiava a "Vitória de Obama no debate!"
Foi mais incrível ainda o que a mídia americana e internacional fez para boicotar a candidata a vice de Mc Cain, Sarah Palin. Num primeiro momento, sua entrada em liça parecia um golpe na campanha até então tranquila de Obama. A escolha da governadora do Alaska, Sarah Palin, para vice de John McCain, com uma reversão das intenções de voto nas pesquisas, lembrava a força da opinião pública americana, baseada em princípios morais e religiosos. A candidata era conhecida porque recusou abortar o último dos filhos, mesmo sabendo que nasceria com a síndrome de Down. Mas havia algo “imperdoável” para certos formadores ou deformadores da opinião pública: opunha-se ao aborto em todos os casos; era contra o “casamento” homossexual; era grande defensora de políticas pró-família; era a favor da abstinência sexual antes do matrimônio; defendia o ensino do criacionismo nas escolas. Foi logo taxada de "fundamentalista". Quer dizer, ficou bastante patente para que lado tendiam as simpatias dos magnatas da mídia. E isto, a meu ver, teve enorme peso nas eleições que deram a vitória ao abortista Barack Obama. Mas, algum leitor poderá comentar: o senhor está supondo que o povo norte-americano é composto de débeis mentais, incapazes de discernir e que foram conduzidos pela imprensa falada e escrita para uma direção que eles não queriam. Não é apostar demais na ingenuidade dos americanos?
Respondo dizendo que, se estou enganado, então devo concluir que o povo está num processo de decadência moral, abandonando os princípios morais que fundaram a nação. E nesse caso, cada povo tem o governo que merece. Mas isso não dá a Obama o direito de supor o mesmo sobre outras nações em que uma imensa maioria é contrária a qualquer violação da vida, como é o massacre de crianças, conhecido com o nome de aborto. Isso não autoriza a querer reviver o antigo imperialismo norte-americano, agora sem a justificativa do combate contra o nazismo e o comunismo, mas para ajudar a matar inocentes. No entanto, Barack Obama invocou a benção de Deus sobre os Estados Unidos, no seu discurso como candidato vitorioso. Por que então, logo em seguida, feriu gravemente a vontade divina, patrocinando o aborto? Mau sinal. A menos que retroaja, o novo presidente americano corre o grave risco de passar para a História como o presidente que começou uma “Nova Era” de desgraças para o povo yankee e para o mundo. Deus tal não permita.
* Cláudio De Cicco é professor de Teoria Geral do Estado na PUC-SP e livre docente em Filosofia do Direito pela USP. É autor do livro “História do Pensamento Jurídico”, São Paulo, Ed. Saraiva, 2009, 4ª Ed.