São Paulo, terça-feira, 06 de outubro de 2009
FRANCESCO SCAVOLINI
É com relação aos valores éticos e morais que sustentam a sociedade que a escolha de Toffoli deveria nos deixar preocupados
O PRESIDENTE Lula, há poucos dias, convidou o ex-advogado- geral da União José Antonio Dias Toffoli para ocupar uma vaga de ministro do Supremo Tribunal Federal, a máxima instância do Poder Judiciário no Brasil. Sabatinado pelo Senado, Toffoli foi aprovado.
A escolha do presidente causou perplexidade em alguns setores da sociedade, tanto no meio jurídico quanto no meio político, principalmente por questões ligadas ao currículo "escolar" e "profissional" de Toffoli.
Tais questões já foram exaustivamente discutidas. Assim, as considerações que seguem, e que desejo compartilhar com os leitores, têm o objetivo de suscitar uma reflexão a respeito dos fundamentais valores éticos e morais que, como alicerces, sustentam a sociedade em geral e, de maneira especial, as instituições que governam os cidadãos.
Tais valores são o respeito ao direito à vida de todo ser humano e a preservação e a promoção do catalisador vital da sociedade, que é a família. É justamente com relação a esses valores que a escolha de Toffoli deveria deixar a sociedade extremamente preocupada.
Numa recente entrevista (revista "Veja", 6/5), o então advogado-geral da União defendeu a descriminalizaçã o do aborto e a união civil entre pessoas do mesmo sexo.
Estamos vivendo numa época em que a sociedade está muito preocupada com a violência que atormenta a convivência social e atinge especialmente as crianças e os adolescentes. Como poderemos resolver esse gravíssimo problema se formos institucionalizar comportamentos que aumentarão a violência e a fragmentação social?
Médicos e psiquiatras são quase unânimes ao afirmar que os traumas e as consequências do aborto são terríveis para a saúde da mulher, pois, afinal de contas, trata-se do assassinato de um ser humano inocente e indefeso.
Assim também educadores, psicólogos e sociólogos mostram, com dados concretos e estatísticas, que crianças, adolescentes e jovens que vivem com o pai e a mãe em uma família unida e estável têm muito menos chances de protagonizar ou de serem atingidos por episódios de violência, deixando mais segura a sociedade toda.
Critério básico de toda reta ordem jurídica deveria sempre ser a relação com a pessoa humana como depositária de uma dignidade inalienável, tanto em sua dimensão individual quanto em sua dimensão comunitária.
Torna-se, portanto, importante fazer todo esforço para que seja realizada uma efetiva tutela dos direitos humanos fundamentais, sem, contudo, construir ao redor deles teorias e comportamentos que acabam por privilegiar somente alguns aspectos desses direitos ou aqueles que correspondem a particulares interesses e sensibilidades de um determinado momento histórico (por exemplo, o "direito" da mulher -defendido por Toffoli- de interromper a gestação, matando um ser humano inocente e indefeso, ou, ainda, o "direito" de institucionalizar uma união antinatural, como a homossexual) .
Dessa forma, ficaria esquecido aquele essencial princípio que é o da indivisibilidade dos direitos humanos, princípio que está fundamentado na unidade da pessoa humana e em sua intrínseca dignidade.
Sem dúvida, a unidade do direito e da ciência jurídica encontra seu fundamento numa justiça dinâmica, expressão não somente da estreita ordem legal, mas principalmente daquela razão natural ("recta ratio") que deve governar os comportamentos dos cidadãos e das autoridades.
É isso o que afirma são Tomás de Aquino quando nos lembra que "omnis lex humanitus posita in tantum habet de ratione legis, inquantum a lege naturae derivatur" ("toda lei humana só possui valor de lei se provem da lei natural", cf. "Suma Teológica", I-II, q. 95, a2).
O relativismo ético que parece permear a hodierna sociedade consumista constitui um grave perigo também para o nosso querido Brasil.Enquanto um recente "spot" publicitário do nosso governo federal enaltece alguns países estrangeiros (entre os quais a Holanda) pelo suposto alto nível educacional atingido, eis que a Justiça holandesa reconheceu recentemente o "direito" de participação democrática nas eleições daquele país ao partido dos pedófilos.
FRANCESCO SCAVOLINI , doutor em jurisprudência pela Universidade de Urbino (Itália), é especialista em direito canônico.