Depois que me afastei do CFM, onde estive por 15 anos, adotei o princípio de me manter calado sobre tudo o que ali se desenvolve. Mas a recente notícia de um apoiamento do CFM pela ampliação do aborto legal para até 3 meses mediante justificativa de razões psicológicas, me força quebrar o meu silêncio, pois penso que esta decisão não reflete o pensar médio do médico brasileiro e está frontalmente contra o Código de Ética Médica que foi elaborado pela maior parte dos que hoje emitem esta nova posição.
Bom. Não sei como encaminharam a discussão, mas como está nos textos divulgados na mídia, me perdoem os meus queridos amigos Conselheiros Federais, esta decisão é profundamente contraditória com os Princípios Éticos do nosso Código de Ética Médica e expressa de modo extremamente confuso na mídia nacional: É contra o aborto e a favor da morte do feto, desde que haja um acordo entre a mulher e o médico.
Quando o CFM fala em nosso nome, é porque ele pode agir legalmente assim. Mas todos sabem que a capacidade legal só tem sustentação se for respaldada na capacidade moral. Neste caso, esta capacidade moral se constitui quando a opinião se encontra embasada na vontade manifesta da categoria médica. A questão é esta: Quando nos ouviram sobre o assunto? Quando perguntaram aos médicos brasileiros o que eles pensam sobre o aborto? A resposta é NUNCA. Nem antes e nem agora.
Assim, o posicionamento do CFM é apenas e tão somente o posicionamento majoritário de seus membros, e NUNCA, pelo menos até que consulte aos mais de 300.000 médicos brasileiros, a nossa posição sobre o assunto. Mas infelizmente o que se lê na mídia é que esta posição é a nossa posição. Isto não é verdade e deve ser corrigida em nome de um comportamento ÉTICO que esta casa respeita, ensina e defende. Passando esta etapa primordial e mais importante, não há como fugir à discussão ainda que superficial de alguns aspectos do texto modificador da legislação penal brasileira sobre o aborto naquilo que mais deve preocupar o médico: A assistência à saúde.
Alegam os defensores do texto que as mulheres brasileiras estão morrendo nas clínicas clandestinas, e isto é verdadeiro. O que não se discute e nem se aprofunda é porque isto acontece. Se quisermos reduzir o problema a uma afirmação, posso dizer que é porque o Estado brasileiro não cuida dela. Não há educação. Não há saúde de qualidade. Não há política real de defesa da mulher vulnerável. Não há Estado protetor e solidário. Sobram apenas discursos e propagandas. Digam-me, meus queridos amigos, do fundo de seus corações, vocês acreditam que este mesmo Estado será capaz de colocar equipes de apoio para ajudar a gestante na difícil e sofrida tarefa de decidir sobre a realização do aborto?
Quem nem tem sido capaz de acolher adequadamente as vítimas de estupro vai ser capaz de agir nesta nova situação mais cinza? Se vocês têm convicção que a resposta é sim, permaneçam na defesa do projeto de regularização do aborto no Brasil. Para mim a resposta é NÃO. O resto é jogar para a platéia midiática que relativiza tudo, até mesmo a dignidade da pessoa humana... a não ser se deixamos de considerar um feto desprovido desta dignidade.
Fraternalmente
Edson de Oliveira AndradePneumologista e ex presidente do Conselho Federal de Medicina