Dr. Israel Gomy
Muito se
discute o abortamento de fetos anencefálicos, mas pouca atenção se dá à
prevenção da malformação. É preciso primeiro entender como se desenvolve essa
anomalia. Apesar do nome anencefalia (ausência do encéfalo), um tecido neural
funcionante está presente em graus variados. Embora haja óbito geralmente até a
primeira semana de vida, pode ocorrer a sobrevivência, em alguns casos, por até
meses após o nascimento.
Ocorre
em um para cada mil nascimentos, predominantemente no sexo feminino. Resulta do
não-fechamento da porção anterior do tubo neural até a quarta semana de vida.
Há vários fatores de risco: se um casal teve um filho com anencefalia, a chance
de ter outro com a doença é de 4%, ou 40 vezes maior que na população geral.
Carência de ácido fólico antes e no início da gravidez aumenta o risco em duas
a oito vezes. Outros fatores são defeitos no metabolismo do ácido fólico,
diabetes materna, falta de vitamina B12, uso de certos anticonvulsivantes,
obesidade e febre na gravidez.
O
consumo de 400 microgramas de ácido fólico, de três meses antes da concepção
até o terceiro mês de gestação, pode reduzir o risco em até 70%. Isso levou os
países industrializados a recomendar suplementação diária com ácido fólico e
dieta rica em folato. Entretanto, menos de 40% das mulheres em idade fértil
seguem a recomendação, e nem isso nos países em desenvolvimento. Seria portanto
mais eficaz fortificar os alimentos. O Ministério da Saúde exige dos
fabricantes de farinhas de trigo e milho enriquecimento com ácido fólico e ferro.
Mas será
que a exigência está sendo cumprida?A prevenção da anencefalia supera outras
medidas que se pretendem adotar em nosso país, um Estado respaldado por uma
Constituição que garante a inviolabilidade da vida - mas que infelizmente nem
sempre é cumprida.
O Dr.
Israel Gomy é médico geneticista do Hospital das Clínicas da Faculdade de
Medicina da USP de Ribeirão Preto, SP.