sexta-feira, 16 de maio de 2008

Juiz dá "pito" em deputados após discussão sobre aborto

Quarta-feira, 14 de Maio de 2008 18:51
Marta Ferreira

http://www.campogrande.news.com.br/canais/view/?canal=8&id=227050

Responsável pelo processo contra a médica Neide Motta, acusada de manter em Campo Grande uma clínica especializada em abortos clandestinos, por mais de 20 anos, e contra funcionários do estabelecimento e mulheres suspeitas de serem clientes, o juiz Aluízio Pereira dos Santos, da 2ª Vara do Tribunal do Júri, mandou ontem um recado claro aos deputados federais, em resposta à petição encaminhada à Justiça pela Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara, pedindo que mulheres sob acusação de fazer aborto ilegal na clínica não sejam indiciadas.

O magistrado, no pronunciamento durante reunião com o presidente da Comissão, Pompeo de Mattos, disse que, a abertura de processos contra elas apenas cumpre a lei em vigor no País e que, se os parlamentares discordam do que está valendo, é tarefa deles mudar as regras.

Na clínica foram encontradas 9,8 mil fichas e todas estão sendo analisadas para decidir que mulheres serão de fato punidas, quantidade estimada em 2,3 mil. O número alto chamou a atenção da Comissão da Câmara, o que motivou até a vinda ontem a Campo Grande do presidente, quando se reuniu com o juiz, promotores e defensor que cuidam do caso.

Antes de vir à cidade, ele enviou expediente pedindo a reconsideração da decisão, alegando que, diante da realidade do País quanto ao tema aborto, processar as clientes da clínica seria um ato discriminatório.

Na resposta, o magistrado relembra que Código Penal define aborto sem autorização legal como crime, com pena prevista de até 3 anos de reclussão. E passa uma espécie de pito nos parlamentares. “Se a lei é anacrônica, se a aplicação tem caráter discriminatório contra as mulheres, ou se está punindo o gênero feminino, ou ainda, se o assunto é de saúde pública pelo risco de virem a falecer, por óbvio, são questões afetas diretamente ao Congresso Nacional, a quem compete privativamente avaliar os elementos que integram o injusto penal, seus efeitos sociais e aspectos políticos e procurar o melhor para a sociedade”.

O magistrado lembra ainda no texto que o Congresso Nacional, na quinta-feira passada, avaliou o tema e rejeitou projeto sobre o assunto. Na discussão, os contrários a qualquer medida que legalize o aborto no País, sequer participaram, como o próprio deputado Pompeo de Mattos afirmou na reunião com os representantes do Poder Judiciário.

Logo, se os legisladores preferiram manter o crime de aborto no código penal, parece indiscutível que sua punição, ao ver dos parlamentares, vem ao encontro do maior interesse da sociedade”, afirma o magistrado no relatório sobre o processo surgido após o fechamento da clínica da médica Neide Mota.

Se é assim, prossegue, “ ao juiz de Direito e promotor de Justiça só resta a alternativa de cumprir a lei, sob pena de cometerem crime de prevaricação previsto no art. 319 do CP., inclusive, sujeitos de 3 (três) a um (01) ano de detenção”.
O magistrado encerra a resposta, salientando, que “no cumprimento do meu dever, não devo prevaricar”.

Depois de ouvir as explicações do juiz e dos promotores do caso, o deputado Pompeo de Mattos mudou o discurso ontem e disse que o que ocorre em Campo Grande deve servir de exemplo para um debate nacional sobre o tema. Ele disse que deve ser marcada para junho audiência pública sobre o tema na Câmara.