segunda-feira, 25 de agosto de 2008

A VIDA E A MORTE NO ATO MÉDICO

Franklin Cunha – Médico
CREMERS 3254
TEGO 256/69

No último jornal do CREMERS o Dr. Marco Antônio Becker, como presidente do nosso Conselho Regional emitiu opinião favorável à interrupção da gestação de fetos presumivelmente anencéfalos e afirma que " É um direito da mãe solicitar a antecipação do parto. Além do risco inerente à gestação, a sua manutenção pode significar um sacrifício sem finalidade". E segue, adiante: " O diagnóstico seguro de anencefalia é realizado durante a gestação pelos exames de ultra-sonografia e dosagens da alfafetoproteí na ". E mais: " Não há porque a mãe, contra sua vontade, correr o risco de morte ao levar uma gestação a termo com um feto cerebralmente morto no seu ventre".

As afirmações do Dr. Becker que cremos equivocadas são de várias ordens.
Em primeiro lugar, são as atinentes à conduta obstétrica. A menos recomendável e mais iatrogênica é a interrupção de uma gravidez em evolução, seja por estimuladores das contrações uterinas seja por cesariana. São consideráveis os riscos de ruptura uterina com suas graves conseqüências na atual e nas futuras gestações.
Segundo. O diagnóstico da anencefalia não está isento de erros de interpretação, mesmo com os exames citados.

Terceiro. Gestações de fetos anencéfalos não aumentam sequer um ponto nas taxas de mortalidade materna. Antes da ultra-sonografia, as gestações e os partos de fetos anencéfalos decorriam normalmente e nos defrontávamos, quase sempre, com duas surpresas: a primeira com a constatação da malformação; a segunda, com o vínculo, apego e o afeto que se estabelecia entre as mães e seus recém-nascidos quando estes viviam alguns dias. Eles eram batizados, recebiam um nome, não raras vezes os pais os registravam em cartório e morriam agarrados às mãos da mãe entre choro e lágrimas dos familiares, os quais ficavam com a sensação reconfortante e inculpada de ter amado seu filho mesmo pelo breve tempo de vida que “ Deus lhe tinha dado “ (sic). E assim podiam dizer: “Não matamos nosso filho, ele morreu“.

Assim, acreditamos que diante de uma constatação segura de um feto anencéfalo, obtida através da tecnologia atual, nossa conduta deve ser preventiva, não através da eliminação do feto, mas sim no sentido de acompanhar e preparar a família para o necessário luto que sempre acompanha este desagradável evento. Esta é, cremos, a legítima e hipocrática arte obstétrica que nossos mestres nos ensinaram. O eminente Dr.Di Lorenzi, professor de bioética diz “que os critérios utilitaristas e as tentativas de definição de vidas viáveis são a mais pura definição de princípios eugênicos e obedecem a orientações político-ideoló gicas.“. E a professora Lívia Pithan, especialista em bioética afirma que : “ O perigo de se usar argumentos para desqualificar a vida humana nos situa numa“ ladeira escorregadia “, donde se pode deslizar para tudo“ como a trágica experiência do Terceiro Reich nos demonstrou e, penso, nos tenha convencido do contrário com o fortíssimo argumento representado por quarenta milhões de mortos.

Enfim, pensamos que diante de eventos envolvendo malformações fetais e na vigência dos debates sobre propalado ATO MÉDICO, cabe uma pergunta: estará dentro das atribuições dos médicos, irredutíveis defensores da vida, decidir sobre a morte de seres humanos?